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Como ser um estudante potiguar nos Estados Unidos anti-imigração de Trump

X estuda numa das universidades mais prestigiadas do mundo. Ele é um estudante potiguar, que não terá seu nome revelado nesta reportagem por medo de perseguição do governo norte americano. Ao chegar aos Estados Unidos, ainda sob a administração de Joe Biden, ele enfrentou algumas situações de racismo, como quando um homem imitou um macaco na saída de um mercado, mas nada perto da preocupação que existe hoje de uma deportação sem maiores motivos.

Num cenário distópico, nos Estados Unidos de hoje, o simples ato de se manifestar politicamente, por si só, já é uma ameaça à permanência.

O lugar onde moro é uma bolha de oposição, é um estado muito democrata. Essas coisas são bastante debatidas na opinião pública, mas não são tão visíveis como são em outros lugares. Aqui, eu procuro não me manifestar publicamente sobre política e não participo de protestos”, revela.

Para alguns imigrantes, o sonho norte-americano se tornou um pesadelo desde que o presidente Donald Trump foi eleito e a política anti-imigração foi colocada em prática de maneira mais severa. O país fundado por imigrantes, agora, adota políticas contra estrangeiros. A situação tem afetado pessoas de várias nacionalidades.

Com a existência do ICE [Immigration and Customs Enforcement] as coisas começaram a ficar mais periclitantes. Não aconteceu aqui, onde estudo, mas numa universidade vizinha, por exemplo, uma estudante foi sequestrada na porta de casa naquele modus operandi… eles usam máscara, não se identificam com uniformes oficiais”, aponta.

Apesar do mal estar generalizado entre estrangeiros, X nos conta que a perseguição e direcionada para grupos específicos.

Há um recorte na perseguição que, pelo menos no caso das universidades, tem sido em relação a estudantes que se mobilizam em torno do conflito Israel-Palestina. As manifestações políticas em defesa da Palestina tem sido os maiores alvos, além de estudantes mulçumanos e russos. Temos um residente russo que não vai poder voltar para casa durante os seis anos de doutorado dele porque ele é russo. Ele me disse que demorou um ano para conseguir o visto, eu consegui no mesmo dia. Tudo depende de como estão as relações diplomáticas do país com os Estados Unidos dos América e, também, o nível de engajamento de cada pessoa no conflito Israel-Palestina. Também, tem a questão dos imigrantes ilegais, mas isso não nos afeta a priori porque somos imigrantes legais”, detalha.

Em outubro deste ano o número de brasileiros deportados dos Estados Unidos atingiu o maior patamar já registrado desde 2020, quando foi iniciada a série histórica. Até outubro, 2.268 imigrantes haviam sido deportados para o Brasil em 2025.

O governo Trump também assinou decretos e ordens proibindo universidades de aplicarem políticas de inclusão e diversidade. Aquelas que resistiram tiveram cortes financeiros.

No meu departamento —, nós temos muita liberdade e nos ciclos que ando, que tem pessoas evolvidas nesse tipo de pesquisa, há bastante liberdade. Mas sofremos cortes de verba e admissão. Por exemplo, toda a faculdade da qual faço parte teve um corte de 60% nas admissões. Então, ano que vem vai entrar muito menos gente. É assim que observamos o reflexo dessa política, mas em termos do que nós podemos falar, dentro dso ciclos onde estudo, existe muita liberdade porque, no final das contas, a administração mudou, mas as pessoas que estão aqui são as mesmas. Elas não mudaram o pensamento delas. Mas a universidade teve que tirar todos os programas de inclusão e diversidade, é uma normativa, não pode mais dizer que incentiva a entrada de estudantes LGBT, negros, entretanto, as pessoas que estão fazendo a seleção são as mesmas. Então, apesar de oficialmente o discurso mudar, os professores ainda vão ver esses estudantes chegando, mas não pode haver menção oficialmente”, resume.

Trump também assinou decreto que lhe confere poderes para censurar exibições de arte que tenham recursos públicos. A ordem é a glorificação dos Estados Unidos nos museus. Apesar do cerco, o governo encontra resistência, principalmente, dos próprios norte-americanos.

Uma das coisas que mudou na nossa vida é que nos prédios das universidades há papéis dizendo que não vão abrir se a polícia do ICE aparecer. Outro que também vi dizia ‘Se você acha que está sendo perseguido pela polícia do ICE, entre neste prédio porque aqui eles não podem entrar. Onde vou, sempre tem uma plaquinha assim. Fora da universidade, nos mercados locais e lojas, também vemos panfletos dizendo ‘Não abriremos para o ICE, se ele aparecer aqui!’. São iniciativas dos cidadãos, dos próprios norte-americanos”, conta X.

Somando as boas relações diplomáticas entre Brasil e Estados Unidos à discrição pessoal que tem mantido na vida política, o potiguar acredita não correr maiores riscos de perder a oportunidade que conquistou de estudar no exterior.

Só evito me manifestar publicamente, não participo de protestos até porque quando isso acontece, tem sempre muita gente filmando e aí eles (ICE) adoram porque vão atrás das filmagens. Por isso pedi anonimato porque se colocarem meu nome do google vão atrás de tudo que tiver. É o que tenho mais receio”, admite.

Para X, a impressão é de estar assistindo o império ruir por dentro. Um cenário no qual as medidas de Trump revelam uma tentativa de resgatar o sonho americano pintado numa máscara que já caiu.

“O que está acontecendo aqui escancara os limites do nacionalismo imperialista nos Estados Unidos que tem mostrado, não só para a comunidade norte americana como para muita comunidade internacional, o quanto esse discurso de imperialismo não cola mais, exceto com aquele grupo específico que não representa a totalidade. Percebi que há dois Estados Unidos, o primeiro é esse país da supremacia branca, imperialista, Ku Klux klan, racista e tudo isso. O segundo Estados Unidos é aquele feito pelos imigrantes, que é um país multicultural, e essa é a parte legal desse país, muitas culturas diferentes convivendo nos mesmos espaços e construindo comunidades. Acho que isso é o que tem de mais bonito nesta terra. Esse discurso de levar a liberdade, de que são os maiores é profundamente arraigado, mas já não dá mais conta. Os Estados Unidos tem deixado de ser essa referência mundial, que foi o que aconteceu com a Europa depois da Segunda Guerra Mundial, quando passou a ser os Estados Unidos, o que tenho percebido é que, aos poucos, esse pensamento anti-imperialista tem se alastrado mais. As pessoas vêm pra cá em busca da grana, mas sabendo que não é as mil maravilhas. Esses discursos imperialistas não convencem mais. Às vezes a impressão que tenho é de estar observando o império em decadência, a passos muito curtos”,  resume o pesquisador potiguar.

Fonte: saibamais.jor.br

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