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Projeto do RN, “Escritores do Cárcere” ganha prêmio nacional em Brasília

O projeto Escritores e Escritoras do Cárcere, desenvolvido pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte (TJRN) no Complexo de Alcaçuz, em Nísia Floresta, venceu a 22ª edição do Prêmio Innovare, na categoria “Juiz”. A cerimônia ocorreu nesta quarta-feira (3) na sede do Supremo Tribunal Federal (STF), em Brasília (DF).

Foram premiadas sete práticas finalistas entre mais de 700 projetos inscritos de todo o Brasil. A Agência SAIBA MAIS contou a história do projeto no final de novembro. A iniciativa surgiu em 2012 acompanhando inicialmente Newton Albuquerque, publicitário paulista que passou 10 anos em Alcaçuz e em 2019 lançou a obra “A Escolha Errada”. O livro relata como o publicitário foi parar na cadeia por tráfico de drogas e e o que viu durante o massacre de Alcaçuz, episódio sangrento ocorrido em 2017 que deixou 26 mortos.

Desde então, o Escritores do Cárcere tem incentivado homens e mulheres privados de liberdade do sistema carcerário do RN a produzirem textos literários e autobiográficos, utilizando a escrita como forma de reflexão, responsabilização, transformação pessoal e reintegração social. Em 13 anos de existência, o projeto já levou nove livros ao mundo.

Projeto contabiliza hoje mais de 20 obras acompanhadas e apoiadas, sendo nove publicadas  – Foto: TJRN

A atividade é coordenada pelo juiz Fábio Wellington Ataíde Alves e pela servidora Guiomar Veras, que estiveram presentes no evento. Segundo o magistrado, os reclusos têm a oportunidade de recomeçar suas próprias vidas através da literatura. 

“Homens e mulheres estão escrevendo suas histórias de vida e mudando a história de vida no sistema de Justiça. Nós estamos compreendendo o sistema de justiça do RN a partir da história de vida das pessoas encarceradas”, afirmou o magistrado.

Além dos coordenadores, o desembargador Glauber Rêgo, supervisor do Grupo de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e Socioeducativo (GMF) do TJRN, e a juíza Sulamita Pacheco, coordenadora-geral do grupo, também participaram do momento e celebraram a vitória.

O desembargador destacou que, para aqueles que acreditam na iniciativa, este momento representa uma importante conquista. 

“Hoje é um dia de imensa alegria e emoção. Cada página escrita dentro de uma prisão é um grito de humanidade, é um grito de esperança no seu processo de ressocialização’, afirmou Glauber Rêgo.

Para a juíza Sulamita Pacheco, o prêmio tem um impacto significativo no sistema prisional não só do Rio Grande do Norte, mas de todo o Brasil. 

“Ele mostra que é possível, através das letras e da escrita, se reintegrar à sociedade. Através do GMF, trazemos a possibilidade da sociedade, ao menos, respeitá-los e aceitá-los como cidadãos que são”, declarou.

Potiguar na Academia Brasileira de Letras do Cárcere

O Escritores do Cárcere já produziu frutos que chegaram à Academia Brasileira de Letras do Cárcere (ABLC). A potiguar Amanda Karoline, natural de Macaíba, é a integrante da cadeira número 11 da ABLC. Ela é a autora do livro “De Tambaba à prisão: uma trama real de violências e abusos no paraíso do nudismo brasileiro”. A obra já vendeu mais de três mil exemplares.

Amanda foi presa por ter contratado um pistoleiro para executar seu marido, com quem foi casada por oito anos, após uma rotina de violência que, segundo ela, já começou no primeiro mês de matrimônio. Atualmente, a potiguar está em regime aberto.

No exemplar, Amanda conta sua história após ser encorajada pela policial penal Joana Coelho. À reportagem, no final de novembro, ela disse que até entrar no sistema prisional em 2016, nunca tinha sequer pisado dentro de uma delegacia. A condenação em júri popular a 20 anos de prisão, ocorrida em em 2018, a revoltou. A escritora diz que a unidade em que ficou presa era pequena, sem nenhuma oficina e com poucas atividades para remissão, com vagas já ocupadas. Os livros foram uma forma de não ficar parada dentro da cadeia.

“Quando eu recebi essa sentença, me revoltou porque a gente vê todos os dias homem matar mulher, estuprar, espancar, e a pena dele ser mínima ou muitas vezes ele responder esse crime em liberdade. Então, uma policial [Joana Coelho] me encontrou revoltada, foi ela que me incentivou à escrita e a escrita me libertou de tantas mazelas, me curou de tanto trauma”, relatou.

Esse primeiro livro a que ela teve acesso foi “Prisioneiras”, de Dráuzio Varela, que conta a vida nas prisões femininas. 

“Eu queria fugir daquela realidade que eu me encontrava”, diz Amanda. O “Prisioneiras”, para ela, “foi fundamental para eu pegar gosto pela leitura e a importância de quanto a leitura e a escrita nos liberta”, explicou.

Como funciona

Na prática, cada pessoa privada de liberdade que participa do projeto pode produzir até 12 textos por ano, com no mínimo 10 páginas cada, em formatos como: contos, cartas, diários, ensaios, cordéis, crônicas, peças teatrais etc. O conteúdo é avaliado por uma equipe interdisciplinar e por meio de parecer do juiz coordenador e de pedagogo. Os pareceres serão enviados ao juiz para fins de remição ou o próprio advogado do escritor envia o pedido com o parecer ao juiz competente.

O projeto utiliza, como metodologia: escrevivência, inspirada por Conceição Evaristo, valoriza a escrita como expressão legítima de vivências e emoções; a Literatura Marginal, ética do cuidado e pedagogia libertadora (Paulo Freire), com abordagens que respeitam a linguagem, a cultura e a história de cada autor e; os círculos restaurativos (quando viáveis), que envolvem o autor, outros apenados, egressos, familiares e membros da rede de garantias.

Fonte: saibamais.jor.br

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