Por Pedro Moreira. Professor de História, militante dos Direitos Humanos e membro do Centro de Referência em Direitos Humanos Marcos Dionísio da UFRN
Com o término do trânsito do julgamento que levou Bolsonaro, General Heleno e outros golpistas para a prisão, muitas pessoas proclamaram ou escreveram a frase: “A História não falha”, atribuindo a essa “entidade superior” o êxito em condenar pela primeira vez pessoas que tentaram aplicar um golpe de Estado no Brasil. No entanto, há um erro crasso nessa afirmativa, pois falhar ou acertar são atitudes inerentes ao ser humano e não da História. Vejam bem, seguindo a lógica da “História infalível”, o General Heleno já deveria ter sido condenado há muito tempo pelos crimes cometidos na ditadura, bem como outros agentes desse terrível período da história brasileira. Contudo, nós sabemos que a anistia de 1979 também serviu aos torturadores e outros criminosos do Estado brasileiro da época. Dessa forma, teria a História falhado? Não, a falha é nossa enquanto sociedade e sujeitos históricos que compõem esse meio social.
Não é do meu interesse aqui culpabilizar gerações anteriores, nem apontar falhas dos setores responsáveis, mas o fato é que a anistia concretizada em 1979 foi um ataque à memória das milhares de vítimas, familiares dessas pessoas e ao Brasil como um todo. Enquanto sociedade nós falhamos, não foi a História. Sendo assim, é importante destacar a importância da pressão social para que dessa vez não houvesse perdão aos golpistas. No dia 09 de janeiro de 2023, um dia após a tentativa de golpe, a esquerda brasileira mobilizou milhares de pessoas que saíram entoando o grito de “Sem Anistia” pelas ruas do nosso país. Recentemente, no dia 21 de setembro de 2025, o campo popular nas suas diversas ramificações, vocalizou novamente nas ruas o grito de “Sem Anistia” numa mobilização massiva que tomou conta do Brasil. Esses são dois exemplos que mostram o protagonismo do povo nessa vitória. Dessa vez, nós (sujeitos históricos), não falhamos, conseguimos uma vitória popular que colocou os golpistas na cadeia.
É importante frisar que frases como: “A História vai jogar tal personagem da extrema direita na lata do lixo”, “A História não vai perdoar, vai condenar tal pessoa”, são afirmativas falsas que não condizem com a história do Brasil. Para constatar isso basta procurar saber como foi a vida de diversos agentes da ditadura empresarial-militar após a redemocratização, nenhum sofreu consequências dos seus atos criminosos. Perceba que eu estou me referindo apenas à ditadura de 1964, mas é possível verificar a mesma complacência com golpistas de outras épocas. Dessa maneira, condenar, julgar e outras atitudes desse tipo, são responsabilidades nossas enquanto sujeitos históricos. Não devemos terceirizar tais atitudes para uma entidade superior chamada “História”, afinal quem faz essa tal de história somos nós.
Portanto, devemos exaltar a participação popular que fez uma grande pressão pela condenação de Bolsonaro e dos demais golpistas, logo, também é dela o mérito disso. Evidentemente que o Superior Tribunal Federal teve a sua importância, mas isso não descaracteriza a vitória do povo. Nós, militantes dos direitos humanos, comemoramos a frustração do golpe e muito mais a condenação dos golpistas. A pauta dos direitos humanos já teve um enorme retrocesso na gestão de Bolsonaro, muito pior seria caso o golpe tivesse dado certo. Por fim, ao invés de falar que a história não falha, é muito mais saboroso ressaltar a dimensão popular nessa vitória, assim como afirmar que nós não falhamos enquanto sociedade dessa vez e vamos lutar para que o erro de outrora não seja mais repetido.
Fonte: saibamais.jor.br